domingo, 13 de abril de 2014

O momento em que viramos palhaços

     Em toda a minha vida recordo de ter ido ao circo umas quatro ou cinco vezes. Tudo o que se comenta sobre magia e tristeza perpetradas pelos personagens que integram este universo nunca me pareceu exagero Tristeza ao som de fanfarras.

Assim, aquela história de fabricar o riso no rosto dos espectadores enquanto se vive um grande dilema pessoal está longe de ser  um clichê de filmes e reportagens.  A vida é o que o circo tentou e miseravelmente não conseguiu nos apresentar em espetáculo de duas horas com atrações diversas.

Minha percepção deste tipo de lugar mudou quando um velho amigo de infância me confidenciou que havia encontrado o pai, sumido há uns 10 anos, no circo que se instalava  por pouco tempo na cidade.

O fato é que este amigo trocou algumas palavras com o pai, que o abandonou

 ainda criança, e neste breve encontro, o agora ancião, relatou o arrependimento pela  decisão impensada, falou sobre sua nova família, os colegas de circo, confessou a luta contra o alcoolismo e admitiu a  doença que o minava aos poucos.

Após este encontro, e alguma relutância, meu amigo retornou poucos dias depois ao local para vê-lo mais uma vez. Foi informado pela trupe de artistas que seu doente pai havia morrido e como último desejo lhe deixado  uma maleta de couro e uma chave. Ao abrir encontrou um relógio de pulso, o anel de casamento, uma navalha e um chapéu. O simples relato de tudo isso fez meus olhos marejarem e por pouco não chorei.

Pouco tempo depois e ainda com a aquela história na cabeça tive a alegria bizarra de presenciar um decadente espetáculo em um circo muito pobre e improvisado que não possuía globo da morte, elefantes, nem trapezistas. O principal momento do lastimável espetáculo se devia aos contorcionismos de uma menina de uns 12 anos chamada Suellen. A magrelinha escapava de labirintos de metal enquanto fazia evoluções com uma bola de plástico provando ser invertebrada, tamanha era sua mobilidade e agilidade que se a Nadia Comaneci de 1976 visse a Suellen desistiria da carreira.
Um urso nervoso, por estar aprisionado numa gaiola minúscula, dava o tom melancólico do local. Nem é preciso dizer que a intenção do riso naquele momento tinha sido trocada por um nó na garganta e um sorriso meio amarelo do tipo “mas o que é que eu estou fazendo aqui ?” estampava o meu rosto.

Claro que o universo circense sempre foi muito explorado, cantado em verso e prosa e edulcorado para as massas como um pedacinho do céu que desceu à terra. Nada mais falso.

Do drama pessoal do profeta Gentileza - testemunha ocular do incêndio no Gran Circus Norte Americano, em 1961, em Niterói. 400 vítimas -  ao fim destes espetáculos mambembes por pura falta de local e porque não dizer público;  o show inventado séculos atrás viu sua morte lenta ser finalmente decretada.


Sim. Ainda temos o Cirque Du Soleil, o Mister M, o Patati e Patatá e os mágicos paraguaios que o Ratinho descobre de tempos em tempos... Mas não é a mesma coisa.

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