domingo, 13 de abril de 2014

As provas do crime

     Quando Osvaldo viu o Fiat Uno prata com aquele enorme Pikachu amarelo colado na traseira do veículo ele não teve dúvida:  era mesmo o carro da Renata que estava entrando no motel naquela tarde ensolarada de quinta-feira. Ele já desconfiava que estava sendo traído pois sentia que ela já não o olhava mais nos olhos e pior, nunca estava disposta para nada. Mal se viam.
     Um dia antes, quando entrou no bar para acompanhar o jogo da seleção,  preferiu não notar quando as gargalhadas e risos viraram sussurros e buchichos. Estavam falando dele, agora tinha certeza.
     Eu mesmo já tinha visto a Renata outras vezes zanzando pelo bairro com o indefectível Uno, mas mentiria se dissesse que a tinha visto na companhia de outro homem. Bem, ela uma vez  se insinuou para o Marcelo e já dera um abraço mais apertado no Paulão, mas nada que desabonasse muito o Osvaldo. O fato é que o Osvaldo amava perdidamente a Renata e era capaz de cometer as maiores loucuras  para agradar aquela baixinha. Inclusive brigar para valer com os amigos.
     Mas agora o Osvaldo estava numa sinuca de bico. Ou assumia o papel de corno ou esclarecia na marra a situação. O fato é que ele por alguns minutos ficou parado como uma estátua do outro lado da calçada em frente a entrada do motel. Estava confuso, frustrado mas incrivelmente calmo. Precisaria agir e isso o torturava.
     Lembrou que semanas antes a Renata havia telefonado pedindo que ele não a visitasse mais. Marcariam encontros próximo à casa dele. Para um casal que namorava a três anos e estava com a data da festa de noivado marcada, achou um pouco estranho, mas não questionou a vontade dela. Esse era o defeito do Osvaldo: sempre acatava os caprichos e frescuras da Renata. Ela, de uma moreninha magrinha de aparência comum havia passado  por uma metamorfose que saltava aos olhos de todo mundo. Começou cortando e pintando o cabelo de loiro, aposentou aqueles vestidos da vovó e comprou  jeans de cintura baixa que realçava o piercing recém colocado, os pelinhos descoloridos, as lentes de contato azuis e a tatuagem de golfinho no cóccix complementavam o visual cachorra. Uma mudança difícil de acreditar.
     Osvaldo voltou alguns quarteirões foi até sua casa, pegou o carro e dirigiu até o motel. Pensou que poderia entrar lá , procurará-la e desmascará-la na frente do amante indesejado. Conforme mudava a marcha do automóvel a imaginava  nos braços do intruso. Lembrou-se de umas piadas bestas que ouvira dias atrás que só agora faziam sentido. Tinha certeza que todos caçoavam dele... Mas ele não permitiria mais isso.
     Na portaria do motel nem olhou para a atendente e rapidamente achou sua vaga. Logo viu também o carro dela e percebeu que a adúltera nem se dera ao trabalho de abaixar a porta da garagem. Enfureceu-se ao pensar que ela, o amante e agora aquele Pikachu maldito estavam rindo dele. Desligou seu carro e foi caminhando até o encontro deles. Quando subiu as escadas decidiu entrar rasgando e desferiu um chute tão forte contra a porta do quarto que a mesma tombou ao primeiro impacto. Já no recinto estranhou a cama ainda arrumada, a TV desligada e o silêncio incomum. Foi apenas quando deu mais alguns passos é que viu a Renata espantada sentada numa cadeira com uma pilha de papéis em volta dela. Havia também sobre a mesa  canetas, carimbos e livros. Então  percebeu que ela não estava na companhia de homem nenhum. Renata,  que não encontrava sossego em sua própria casa com irmã, crianças chorando e cachorro latindo, ia semanalmente até o motel para corrigir provas, preparar aulas e escrever relatórios.
     - O que você está fazendo aqui ? disse a Renata roubando a frase que seria do Osvaldo.
Ele pálido, surpreso e envergonhado só teve tempo de dizer baixinho:
     - desculpa...
     Naquela tarde Osvaldo teve a certeza que os R$ 315 que pagou pela  porta e trinco arrombados não seriam problema para ele. Já  recuperar o amor e o respeito da Renata com certeza custaria bem mais caro.
Alexandre Pereira

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